Os serviços públicos, o OGE e a proximidade de eleições.

Olhando para a atual conjuntura política é cada vez mais claro que nestes dois últimos anos da legislatura o PS se quer demarcar da esquerda e aparecer como mais centrão, julgo porque acredita que será desta forma que será mais premiado eleitoralmente, quiçá chegando à maioria absoluta. 
Um bom exemplo desta postura é a revisão em baixa das metas do défice do OGE para 2018, alterando unilateralmente o que se acordou quando da negociação do OGE2018. Há aqui uma clara cedência à filosofia da UE de se caminhar rapidamente para o superavit orçamental para se começar a diminuir mais depressa a dívida pública, isto apesar da maior folga orçamental derivada da diminuição do serviço da dívida com a queda dos juros e de mais receitas com o crescimento económico. Quem fica para trás são os compromissos com os parceiros de coligação e com o próprio programa do PS, pois vemos com frequência medidas previstas no seu programa eleitoral serem adiadas, como a baixa da idade da reforma para os trabalhadores com carreiras longas.
Uma consequências desta opção será o abrandamento da reposição de rendimentos, tendo já sido anunciado que não haverá aumentos salariais na função pública. Outra forma de travar esta reposição de rendimentos é a proposta minimalista de recuperação do tempo de serviço congelado com os professores (a que os professores responderão no dia 19 de maio).
Outra situação que tem avançado a passo de caracol é a necessidade de investimento nos serviços públicos para recuperar os anos em que o investimento foi nulo ou marginal, resultando daqui a degradação de equipamentos. O caso mais gritante foi o da ala pediátrica do hospital de S. João com os meninos e meninas da oncologia, mas em educação passa-se o mesmo ao nível dos equipamentos informáticos, que cada vez mais estão obsoletos e tornam uma miragem haver condições para se alterar o tipo de ensino tirando partido das TIC. A minha experiência é a de que muitas vezes não encontro uma sala de computadores disponível para dar aulas, fruto da falta de investimento nas escolas alargando o número de salas que dispõe de computadores (reportagens sobre outros países mostram que o normal é haver computadores nas salas de aula, enquanto em Portugal aulas com computadores ainda são a exceção).
Mas em educação o ministério tenta alterar a política educativa promovendo alterações, como generalização da coadjuvação, mas como não há recursos económicos disponíveis, esta só acontece num bloco de aulas de 15 em 15 dias, o que vai limitar os efeitos desta estratégia devido à falta de recursos financeiros. Todos sabemos que a solução ideal seria ter turmas mais pequenas e desdobramentos destas em disciplinas nucleares, o que permitia que houvesse de facto a tal pedagogia diferenciada em função das caraterísticas dos alunos. Como não há dinheiro fazemo-lo só em 1/4 ou 1/5 das aulas para não se contratarem mais professores e à custa da intensificação do horário dos professores que passam das 22 horas semanais para as 28/30 de trabalho com os alunos não contabilizado como tal. Outro exemplo é a generalização de cursos profissionais, mas sem dar condições físicas e pedagógicas para os cursos serem eminentemente práticos, mesmo nas disciplinas não técnicas.
Sei que a recuperação da falta de investimento durante a intervenção da troica não se recupera em pouco tempo, mas a prioridade à redução do défice mais acelerada acaba por limitar este esforço de recuperação do défice de investimento e de recursos humanos nos serviços públicos essenciais, saúde e educação. A solução é pretender que se altera a política educativa sem recursos, pois quase tudo fica na mesma nos outros 3/4 ou 4/5 dos tempos letivos, portanto arranjando soluções criativas à custa de mais trabalho para os professores e com resultados muito limitados.
Concluindo a opção por menos défice que decorre de uma estratégia eleitoral de se desmarcar de uma colagem à esquerda e aparecer como partido do centro leva o PS a abrandar na reposição de rendimentos e na melhoria dos serviços públicos essenciais como saúde e ducação, optando por soluções criativas com recurso à intensificação do trabalho dos recursos humanos e com efeitos práticos muito limitados.

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